Viagem marítima
O barco que nos espera não está
no fim nem no princípio do mar. Temos
de passar a primeira onda, e de subir
depressa, antes que uma outra chegue;
depois, é preciso ver se há remos. E se
não houver, teremos de confiar no
vento, para que ele nos leve para o mar
sem ventos nem ondas. Mas antes disso, há
uma âncora que se tem de puxar; e
se ela não couber no barco, pode-se atirá-la
à água: no mar para onde vamos não
é preciso âncoras. Também não
precisamos de barcos. E também não
precisamos de remos. No mar do fim do
mundo, a água é parada, e pode-se andar
por cima dela, fugindo ao cão que nos
empurra para terra. Então, pensam
uns, a âncora poderia servir para amarrar
o pescoço do cão, e obrigá-lo a estar
parado. Mas o dono do cão deita a sua rede
para apanhar os que querem voltar ao
largo, como se pudessem sentir de novo
o vento e as ondas. E quando chega a terra,
para esvaziar a rede, não perde tempo
a contar a sua pesca. Por isso, há quem
não olhe para o barco, como se ele não
estivesse lá, e espere pela manhã seguinte,
enquanto outros tomam o seu lugar.
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