A a Z

sexta-feira, maio 19, 2006

Ouvindo o violino



Com o pé na cadeira, prepara-se para se
vestir; e o homem do violino nem repara que
ela está em cima da mesa, onde ainda ficou
a garrafa que ele quase esvaziou, até
ela lhe pedir que tocasse, enquanto
se veste para a noite de S. João. Aí,
nas aldeias junto aos lagos, as raparigas
fogem para as florestas, à espera do escuro
que não há-de chegar; mas não é para isso
que ela se veste. A sua juventude esvazia-se,
como o vinho na garrafa; e ao olhar para
o músico, o que ela pensa é se ele não
será uma pura abstracção, inventando a melodia
que ela gostaria de ouvir. E também poderia
sair atrás dele, para o meio da floresta onde
iria acender uma fogueira, antes que as amigas
chegassem. Mas a roupa que tem não serve
para uma festa; e o cabelo curto descobre-lhe
o pescoço, que a luz envolve, embora o
homem do violino não se preocupe com
a sua presença. Assim, ela sairá de cima da
mesa, deixando-o acabar a sua peça; e
meter-se-á na cama, enterrando os olhos
na almofada para não ver o sol que ainda
entra pela janela, depois do dia acabar, e
de todas as amigas se perderem na floresta.