Mulher numa cadeira grega (Penélope)
Muito basicamente, a experiência da viagem
parte de uma ideia de ilha: e o destino, a que se dá
o nome de Ítaca (desde os gregos), obedece
a um desenho de cais que vai sendo esboçado
mentalmente até ao dia em que, sem que ninguém
o esperasse, o gajeiro anuncia terra, fazendo
com que todos os tripulantes acorram à amurada,
de onde se avista uma linha de praia, emergindo
do horizonte, e as primeiras gaivotas, que no
princípio não passam de pontos negros sobre
a rebentação. Mas se passarmos do barco para
a ilha, a situação não é diferente; e também
a mulher que se senta no terraço, numa cadeira
grega, espreita em direcção ao horizonte, que
insiste em manter-se deserto. Nessa manhã,
porém, o seu olhar cruza-se com esse mastro que
rompe a primeira bruma do dia; e pode pensar,
por instantes, que é apenas uma ilusão de
óptica, e chamar alguém para a ajudar a ver
o que se avista onde nada deveria haver. Se
ela insistir na sua ideia, o barco limitar-se-á
a passar ao longo da costa, como se ninguém
habitasse a ilha; e só quando o mar volta a ficar
vazio ela se levanta da cadeira, dá uma volta ao
terraço (a tarde começa a escurecer), como se
tivesse outra coisa a fazer para além de estar
à espera, e olha para dentro de si própria onde
uma armada se afunda, sem que ela faça o que
quer que seja para impedir o naufrágio.
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