Retrato de A.P. Ostroumowa-Lebedewa
Um rosto de requiem, não porque a morte nele se
imprima (o tempo encarregou-se de o fazer), mas
porque um medo se exala dos seus olhos, fixos
em algo que pode ser o nada, o vazio do ser, ou
apenas a porta aberta por onde entra o frio
que a recolhe em si própria. Abraço a tua
eternidade; e leio na tua boca a frase que
nela se adivinha, quando o silêncio da tarde
ainda pesa: «Vem comigo»; ou antes, um
convite à viagem de onde ninguém regressa,
aproveitando a fresta do tempo em que o teu
corpo cabe. E se espreito por aí, um céu
de temporal alastra no céu da página, até
onde o horizonte o permite. Por vezes,
adivinho a tua mão, um gesto luminoso
no escuro da planície; e logo te perco,
como se o olhar dos mortos não permitisse
uma demora, uma simples conversa, ou
a imagem do reflexo que se perdeu quando,
no teu canto, desviaste os olhos, e deixei
de ouvir o que me querias dizer.
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