Fim de verão
Nos verões da infância o mar ficava longe,
atrás dos muros que davam para as falésias,
e ninguém se metia pelas ondas a não ser
os pescadores, depois de empurrarem os barcos
e puxarem as redes atrás deles. Nas esplanadas,
havia mulheres, com crianças e criadas a tratar
delas, e protegiam-se do sol com as sombrinhas
que serviam para esconder os seus olhares
furtivos, quando não queriam que vissem
para onde estavam a olhar. Nesses verões, o mar
era a única coisa que mexia, sob o céu imóvel
e um mundo que parecia tão imóvel como o céu,
enquanto as mulheres conversavam, longe
dos homens que estavam nos cafés, de fato escuro
e gravata, a discutir negócios e notícias. A burguesia
parecia eterna, nos verões antigos, e os pescadores
eram luzes longínquas, nuns barcos que a noite
escondia, e não se sabia quando voltavam, a não ser
que o farol tocasse, à noite, e já se sabia que a manhã
seguinte era de nevoeiro. Nos cafés, os homens
não se importavam com isso, e pousavam os chapéus
à entrada, passando a manhã a discutir negócios
e notícias, até o nevoeiro se levantar, e as mulheres
encherem a esplanada de criadas e de crianças,
sem se importarem com as ondas onde nenhum
barco entrou, depois da noite de nevoeiro. Mas
as suas conversas eram mais baixas, para que ninguém
as ouvisse, e não se soubesse que o verão chegava
ao fim, como os negócios que faliam, e as notícias
que chegavam do fim do mundo a dizer
que aquele mundo chegava ao fim.
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